sábado, 9 de maio de 2009

ALÍVIO

Todo ser vivo, nasce, cresce, se reproduz e morre. Acredito nisso, mas não totalmente nesta ordem, e muito menos na quantidade e intensidade que isso se sucede. Quantas vezes nascemos? Alguns seres nem vivem, nasceram para sobreviver eternamente mortos. Outros nascem e morrem inúmeras vezes. Ah! E como vive no mais sublime das emoções. São seres humanos de verdade, são seres vivos, são seres raros.

Preciso liberta um ser para a vida, por isso escrevo. Minha personagem vem dos meus sonhos e tem muita ligação com a fotografia. Pois, toda a arte desperta a alma de uma artista, logo sinto uma enorme necessidade de contar a história de Ana, um bebezinho que fora abandonado no dia em que nasceu. Na escada de um edifício escuro, o bebê apenas choramingava, como se quisesse chamar por alguém. Era noite de lua cheia, e chovia muito! Por sorte ou azar, naquele mesmo edifício morava uma senhora, Beth de Argolo Farias, que nunca viera a ter se quer um filho. A vizinhança comentará que ela tinha uma maldição e não podia ter filhos. Deus havia castigado ela desde o dia em que nasceu. Mas Beth, não parecia ser uma pessoa tão ruim, a ponto de ser amaldiçoada. Já era uma senhora de idade, meio corcunda e desajeitada, mas tinha os olhos doces, que por muitas vezes seu cabelo crespo cai atrapalhando o esse seu ar de meigo.

Naquele momento, o bebezinho chorava muito, despertando a curiosidade de Beth que por ali passava, com um saco de pães na mão. Assustada com os berros do bebê, deixou o saco cair. O bebê no momento mágico sorriu para Beth como se pudesse entender a alma daquela senhora.

Beth rapidamente afagou o bebê nos braços e o pegou pra si. Para ela a emoção era tamanha como se tivesse dado a luz ali mesmo. O bebê era dela, Deus não havia amaldiçoado, tinha concebido a doação de um singelo bebê. E como pagamento o pão nosso de cada dia ficará caído na escada escura, uma fortuna para quem o encontrou. Mas para Beth, o final do arco-íris tinha chegado, seu baú de ouro era aquele bebê enrolado num saco plástico.
Aninha, como carinhosamente Beth a chamava, tinha um certo tipo de pesadelo real. Aos seis anos de idade, não sabia bem a diferença entre sonho e pesadelo. Quando contará a mãe Beth que ela sonhava que seus verdadeiros pais eram artistas, sua mãe uma poetisa e seu pai um musicista. Beth extasiada disse:

- Isso é um pesadelo, minha filha!

- Pesadelo? O que é isso?

Realmente ela estava na fase dos porquês, e Beth teria que ter total paciência.

- Pesadelo, é um sonho ruim, filha.

- Mas, sempre sonho sempre a mesma coisa. E parece tão real, mamãe! Isso me assusta.

Beth não sabia mais o que dizer. E o silêncio terminou aquela conversa.

Ana era uma criança, vamos assim dizer diferente das demais. Beth costumava dizer, com uma voz meio tenebrosa, que sua filha era muito esperta.

Mas o que podemos chamar de esperta? Bem, isso é algo que algo longo da história será respondido sem eu mesma descrever. E a menininha sentia uma agonia e precisava desabafar.

Ana tinha nascido ou encontrada no dia 01 de abril, e carregava em si um carma do dia. Sim, primeiro de abril é o dia da mentira. A criança mentia como gente grande. Não sei bem dizer se essa mania de mentir teria sido geneticamente adquirida ou seria mesmo um carma do dia. Por isso, Beth, não sabia ao certo se seus sonhos eram reais ou puras imaginações da menina.

Alguns anos se passaram e Ana, agora já com oito anos, e ainda assim os sonhos a perseguiam como se fossem avisos do além. Isso a perturbava demais. Certa vez no parquinho da escolinha, em companhia das outras crianças, uma coleginha estranhamente a chamou de Poliana. Como podia uma criança, mentir seu próprio? Poliana era seu codinome, ali entre as crianças, Ana desejava ser apenas Poliana, uma criança com um olhar dócil e inocente. Tão diferente de sua mente esperta e imaginativa. Ana ou Poliana, seja lá como queira a chamar, de fato ela era uma criança tão esperta que enganavam a todos. Ela não conseguia ficar quieta somente em um lugar, sentia uma agonia por dentro, como se a mentira estivesse entranhada em seu ser. Sentia no seu mais íntimo a necessidade de mentir, tinha que colocar para fora aquela agonia. Talvez por medo, daquilo tomar conta de si. Se tornar cada vez maior, e antes que isso a acontecesse já havia mentido, colocado toda essa agonia para fora de si. E sempre vem aquele ser a dizer “ô coitadinha” de Ana, era apenas uma criança indefesa, não em entendi essa agonia que vinha de dentro pra fora. Para ela isso era um mistério. E Aninha, voltou a questionar a mãe, sobre a tal diferença entre elas. Ana era mulata, cabelo liso como um veludo preto, olhos brilhantes como estrelas num luar. Ela me parecia a noite, um ser a ruivar. Como um daqueles lobos, chego até sentir o cheiro de cachorro molhado, sedento de vontade de mentir e mentir. Em dias de lua cheia, sua agonia era maior. Ela era mesmo um mistério, assim como seu nascimento era para Beth.

- Mamãe, como minha cor pode ser tão diferente da sua?

Beth, meio assustada com a inteligência da garotinha, parou por alguns minutos. Estacionou em outra dimensão.

- Filha, eu te criei sou sua mãe. Os filhos não são parecidos com as mães. De onde tirou essas idéias?

- Meu coleginha mamãe, disse que pareço ser adotada, o que é isso?

- Coisa de criança filha, não liga. Veja sua boneca, ela é sua filhinha e é loira. Veja só, mas é sua filhinha. Você cuida dela como se fosse sua, mesmo sendo tão diferente de você.

Bingo! Beth mentiu? Será que além de Ana teremos outra mentirosa. Elas não me parecem tão diferentes.

Mas, não sejamos tão radicais assim. De certo que, ninguém diz a verdade o tempo todo. Até porque, ninguém conhece por inteiro a verdade. Mas porque será que existe a mentira. E a verdade existe?
Verdade ou mentira. A verdade é que ninguém é tão mentiroso quanto gostaria. E a mentira é que ninguém é tão sincero como deveria.

O que é verdade para mim pode ser uma grande mentira para ti por uma vida inteira. Assim como, uma mentira para mim pode ser uma verdade para ti por toda a eternidade. Somente se, algum dia eu venha a te provar que a mentira que você acreditara ser verdade te caia em juízo como a verdadeira mentira de cara lavada.

De certo que estou, depois que ler esta história, as pessoas poderão ficar desacreditadas e desgostosas da vida. E por um segundo, parar e pensar, a se questionar: a vida é uma verdade ou uma mentira?

Pensando bem, a verdade não existiria sem a mentira, assim como a mentira não existiria sem a verdade. Ambas são dependentes uma da outra. Mesmo que teoricamente signifique o oposto uma da outra.

A verdade só existe porque identificamos a falta desta diante de uma mentira. Pois, a mentira nada mais é do que a falta da verdade.

Sabe algumas pessoas são ditos como mentiroso fracassado. Que com a boca diz a mentira. Os olhos a condena com a verdade. Algumas pessoas que fala e desvia o olhar?

Pois, Ana tinha uma auto condenação. Seus olhos brilhavam a verdade enquanto sua boca provia mentiras. Era mesmo uma criança que imaginava demais. Mas, sua consciência sempre reclamava, quando lembrava o que sua mãe Beth a ensinava: mentir é pecado.

Calma, preciso intervir agora. Não é para tanto. Ana é apenas uma criança esperta e super criativa. Mentir é uma palavra um tanto quanto forte demais. Prefiro dizer que Ana apenas “faltava com a verdade”. Porque de fato, a boca de Ana dizia a mentira, mas seus olhos de estrela refletiam em noite de lua cheia a mais pura verdade.

E vamos ser realistas, existem pessoas que mentem tanto que acabam por acreditar na própria mentira. E mentir já não é mais mentir, é a sua verdade. Até porque para pessoas como estas, a verdade simplesmente não existe.

Ana agora estava no colegial, época de adolescência, com seus 14 anos de mentiras. Sua bagagem já era bem pecaminosa. Ela já treinará não deixar mais o brilho do se olhar transparecer a verdade. Ficava por horas em frente ao espelho, se assistindo. Era como se ver por dentro. Cada dia que passava, a cada aniversário seu, a agonia era crescia dentro de si. E seu espelho era seu amigo, seu cúmplice mais perfeito, seu mestre e somente com ele poderia contar. Agora mais velha, ela tinha tomado a consciência de que não sentia Beth como sua mãe, e sabia que existia mentira. Afinal de contas, Ana conhecia a mentira como ninguém. E quem conhece algo, identifica-a facilmente, num pequeno deslize. Como foi no dia em que Ana perguntou a mãe sobre o seu pai. Beth parecia uma névoa de tão branca, suas mãos trêmulas, a boca não conseguia fala uma só palavra, aquela pergunta engasgou goela a baixo. E o silêncio tomou conta daquele momento. Ambas sabiam que a mentira sempre esteve presente desde o dia em que nasceu. E o silêncio assim permaneceu com resposta.

Voltando ao colégio, Ana ou Poliana, nem eu mesma sabia qual era o seu nome, ou qual seria sua mentira agora. Pois bem, Ana ou Poliana haviam morrido naquele silêncio, onde perguntara pelo seu pai. A fase era de muita rebeldia. E ser chamada de Poliana soava meio meigo demais. Foi então que numa novela, Tatiana era uma vilã mal, pois bem, era esse o nome de Ana no colégio, ou será o nome de Poliana? E, eu já nem mais sei. Só sei que tenho que continuar a contar essa história. Poderia parar por aqui. Ana, Poliana ou Tatiana está parecendo mesmo uma vilã de novela. E está história está meio piegas demais. Mas ainda sim, sinto uma enorme vontade de deixar que você sonhe em meus sonhos.
Tatiana, a líder de da turma, mais popular. Realmente, um exemplo de adolescente difícil e complicado de entender.

Dizer a verdade é ser um tanto quanto bonzinho demais. E de certo que Ana, ops, Poliana, esqueci, agora é Tatiana. Voltando então, Tatiana não desejava nem um pouco se passar por boazinha, ela queria ser a complicada, rebelde, malvada, aquela, e desejava ser notada, queria que todos que a respeitassem e sentisse medo. Ela não poderia se quer ter um nome de uma garota boazinha. Agora era Tatiana. Ela trocara de nome numa velocidade incrível.
Vamos desligar e viajar em nosso nada. Se dizer a verdade é ser boazinha E ser boazinha é sinônimo de fraqueza. Ser fraco é mostrar as fragilidades. É ser pequeno demais. E, o ser humano tem mesmo dessas coisas. De se sentir pequeno, quando outra pessoa tem aquele sentimento de pena por ela.

Sentir pena de outra pessoa é como se tornar uma pena. Pequena, delicada, macia, leve, pluma, insignificantemente uma pena. Apenas uma pena. Sim, eu disse, e repito, e escrevo, uma peeeeenaaaaa. Como tantas outras no corpo de um galo. É, este galo da fotografia, está só, com muitas penas a carregar.

É, as pessoas são mesmo assim. Senti pena de alguém, e esse mesmo alguém quando senti que esta sentiu pena dela. É como se sentir uma pena deste galo. Sabe-se lá, qual pena será. Tem tantas penas ai, que fica difícil saber qual é a pena dessa pessoa. Mas, de certo que, se sabe que é uma insignificante pena numa plumagem deste galo que vaga num vazio interminável, por onde vaza a suas angústias.

Voltando a então agora, intitulada Tatiana, que não pode dizer a verdade por que não deseja que as pessoas sintam pena dela. Tatiana é nome de garota forte e não frágil como Poliana. Agora, Ana, depois Poliana e agora Tatiana, não é de quebrar fácil. E a mentira não era apenas uma agonia como antes, a mentira agora a fortalecia a alma e aquilo só crescia. Tatiana não gostava de ser a pena do galo. Por isso, agora mentia mais e mais. Assim era a imagem que ela queria passar. Adorava se sentir forte, descolada e mascar chiclete.

Todos no colégio achavam que ela era filha de grandes e talentosos artistas, a mãe poetisa e o pai musicista. Será mais uma mentira? O silêncio tomou conta do lugar mais uma vez. Não sei bem ao certo, em meus sonhos, encontrei esse bebê na escada de um edifício sem saber de onde surgiu. Quem sabe esta era a melhor explicação para aquele brilho no olhar? Era sua assinatura cardíaca, o brilho dos seus olhos, geneticamente entranhado em seu ser. Porque, de fato, Ana, Poliana ou Tatiana, seja lá quem for, é uma artista. Tanto com as palavras em suas poesias, quanto com as palavras em sua boca em uma de suas mentiras.

Temos que admitir, mentir bem é uma arte. E para poucos. Porque mentir por mentir, todo mundo sabe e já fez um dia. Mas mentir, como ela bem sabia. Não era para qualquer é. Ela era uma artista na arte de mentir.

Voltando a Tatiana, lembro-me da vez em que vi ela chorar, trazendo de volta o brilho do seu olhar. Ela guardará em seu peito um amor! Sim, isso mesmo que disse. Um amooooooor, um amor daquele que machucam. Amor que fere. Amor não correspondido. Sabia que era um homem, aliás nunca duvidei da sexualidade de minha personagem. Ela é mulher que gosta de homem, mas uma mulher um tanto diferente e curiosa. E a curiosidade nos permiti usar coisas que nunca imaginávamos que teríamos coragem. Como já disse, coisas de adolescente. (E não quero mais questionar a sexualidade de minha personagem, meus olhos ardem, já noite e madruga. Estou cansada. Mas preciso continuar).

Era mesmo verdade, ela o ama. Como nunca amou ninguém. Um amor desses que chamamos de platônico. Calma, eu vou contar que é o seu amor. Mas antes preciso respirar mais uma vez.

Um comentário de um amigo “Uma pessoa que não sonha é uma pessoa emocionalmente em coma”.

Minha personagem tem vida sim, complicada, diferente, porém saudável. Pois de sonhos ela vive, e em seu coração há tanto amor que a fez esquecer da mentira. Isso mesmo, minha personagem ficou cega. Sim, cega de amooooorrrr. Agora o coração dela pulsa por amor.

Beth notou a mudança da filha, que parecia mais madura. A fase da rebeldia estava escorrendo, a cada vez que ria e seus olhos brilhavam de alegria. O amor tem dessas coisas. Aliás o amor é o maior e melhor sentimento que já conheci. (poderia ficar a vida toda falando somente do amor, mas tenho que voltar essa história, que está me consumindo, preciso contá-la, urgente).

Tatiana guardará seus poemas numa caixa preta, debaixo da cama. Sua mãe nunca descobriu, até o dia em que por descuido deixou a caixa em cima da escrivaninha. Sim, Beth encontrou sua caixa preta, seus poemas, sua vida, seus segredos, seus desejos, seus lamentos, suas alegrias, suas angústias... e agora? Se ela ler todos os poemas, Beth irá matar minha personagem. E terei que terminar minha história aqui.

Não, por Deus, não e não! Preciso impedir que Beth continue a ler os poemas. Preciso dormir, é isso. Tenho contato com minha personagem nos sonhos. Preciso dormir urgente. Mas estou sem sono, preciso terminar isso. Preciso contar sobre Tatiana, sobre seus poemas, sobre seus segredos, sobre seu mistério.

Beth, curiosa abriu a caixa preta. Não sabia o que a esperava. Nem por um instante ela imaginava o que teria naquela caixa. Ela olhou meio decepcionada por ver papéis.

Mas lógico que não eram apenas papéis, era poemas. Arte impressa. Era vida. Era amor, era o mais puro do eu de Ana, Poliana ou Tatiana.

A curiosidade de Beth era tamanha, que mesmo decepcionada, começou a ler um dos poemas.

Beth em correu em desespero, correu tanto que ao falar com sua filha as palavras ofegantes se confundiam, e nada conseguia dizer.

Tatiana viu seus poemas pelo chão, espalhados com simples papéis jogados. Tatiana se pois a chorar. Tivera sua primeira decepção, passou dias e dias chorando.

Que dor!!! Ela saiu de mim em palavras, estava aqui esse momento. A máquina travou, perdi boa parte dela! Que dor... agora eu choro com Tatiana. Tentarei reescrever numa imensa tristeza de saber que não será igual ao que escrevi segundos atrás. Preciso de ar... ainda não acredito que esta maquina engoliu um enorme pedaço de minha personagem. Somente o vento de um som pra acalmar essa minha dor de perdê-la. Oh, Tatiana é luz, uma raridade.

Ficou durantes dias no quarto escuro fechado, as lágrimas escorriam, e ela reviveu tudo! Sentou no chão frio e sujo, foi pegando poema por poema! Oh, minha Tatiana! Como eu tenho orgulho de você. Você é puro amor em vida!

Tatiana ama sem medo, por isso mergulhava em fotografias. Tatiana ama com paixão, por isso viva intensamente. Tatiana ama de verdade, por isso mentia.

Atrás do mundo escuro de Tatiana havia um corredor, e muito burburinho. As suas colegas que vieram visitá-la falavam da vida de Tatiana.

É incrível como as pessoas falam da vida dos outros. Isso me leva a crê que a vida de Tatiana era mundo mais interessante do que as de suas colegas. Elas viviam em função de falar, inventar, fofocar, aumentar um conto, um fato, um história. E na situação de Tatiana era imprescindível se ouviu a palavrinha “ô coitada”.
Tatiana abriu a porta do seu mundo, e gritou. E vocês? O que são?

Silêncio.

De fato, as colegas de Tatiana não sabiam nem o que era o amor, que dirá quem eram. Elas eram daqueles tipos de pessoas que vivem a vida dos outros, pobres e fracassadas almas, que viviam num cotidiano medíocre... blá blá blá blá... e quem é mesma a “ô coitada”? Quem amou e sofreu? Ou quem nunca amou?

A vida de Tatiana era muito interessante, e preciso contar. Irei falar dela, pois é muito mais interessante do que estou hoje.

Ah, Tatiana ama, por isso perdoa! De cabeça erguida, sorria pra mãe e nunca mais falará sobre o assunto. Era um eterno silêncio entre elas. E esse mesmo silêncio perdurou entre anos, e só voltaram a se falar no dia da morte de sua mãe. Tatiana, agora mais adulta e madura, falou baixinho ao túmulo de sua mãe.

- Mãe, eu te perdoou.

Com as mãos sob as mãos da mãe, doou um poema como se fosse uma rosa.

Tatiana amava Beth, por isso chorava rosas...

O coração de Juliana pulsava numa intensidade tão forte, que fez ela se arrepiar de corpo inteiro. Como se pudesse senti sua mãe novamente. Momento único, ali ela era Ana, Poliana e Tatiana, todas em uma só, todas em um só momento. Pouco importava naquele momento qual era seu nome, seu coração estava entregue, ela era só alma e coração. Seus olhos brilhavam como nunca. Verdade ou mentira, ninguém sabia dos verdadeiros sentimentos dela com a mãe. Era uma relação meio conturbada, fria, seca, muitas brigas e desentendimentos. Às vezes era ódio. Ás vezes era amor. Os sentimentos sempre fora algo muito confuso para Tatiana. Mas acredito que minha personagem apenas não admitia, era medo, por isso escondia o seu grande amor por sua mãe. E sabe, pouco importava se ela era ou não mãe verdadeira, sua cor, sua aparência, isso tudo pouco importava. Tatiana a amava muito, mas mentia para si mesmo. Ela mentia, e mentia de se tornar tão verdadeiro para ela própria. Já sabia mentia pra si, como uma verdade dita do coração. Tatiana ama... e naquele dia Tatiana também tinha sido enterrada junto a sua mãe.

Tatiana chorou para nascer Juliana, uma mulher, uma advogada, uma vencedora. Ela se tornara tudo que sua mãe desejou, responsável madura, rica, uma mulher madura e independente. Juliana não sabia, mas sentia que sua mãe podia ver e se orgulhar da filha que ela se tornará.

Juliana não olhava pra trás, apenas caminhava, e a mentira fazia parte de si. Era como um órgão, indispensável e necessário para aturar os dias sem a sua mãe.

Ás vezes ela fazia a mesma cara de quando era bebezinho, chorando na escada escura. Mas nenhuma lágrima escorreu do seu rosto, depois que sua mãe se fora. Levava uma vida vazia. E seus únicos amigos eram seus inseparáveis poemas. E durante anos viveu assim, escrevendo seus amigos, guardando suas dores num papel, chorando em palavras...

Todos os dias pareciam tão iguais para Juliana. Ela se sentia cansada da seriedade de sua vida, tão formal, fria, calculista, não tinha amigos, apenas alguns amantes, mas sentimento só tinha por seus poemas. Ela amava seus poemas. Era tudo pra ela. Era sua vida. Era o refúgio de sua alma. Ali era o seu momento. Ali ela era só ela.

Esse é um dos momentos que me preocupava. Minha personagem estava se escondendo cada vez mais em suas mentiras. Para a sociedade ela era uma ricaça solteirona, feliz e bem sucedida. Feliz? E o que é a felicidade? Juliana tinha tudo que uma mulher poderia desejar. Roupas da moda, jóias, o homem mais lindo aos seus pés, um carro importado, uma mansão, fazenda, uma ilha particular, além de ser uma mulher linda e sensual. Mas do que valia isso? Ela só vivia quando escrevia.

Em dias de chuva, Juliana já uma senhora idosa, se escondia ainda atrás de seus poemas. As gotas escorria por suas contas sob uma capa plástica de cor azul marinho, suas pernas já eram tão fracas que não suportavam caminhar. Ela parava em cada esquina e esperava, mas ninguém chegava. Essa era mesmo sua sina, ser abandonada num envolto de um plástico vazio.

Uma vizinha certa vez havia indicado um terapeuta famoso, e na mais alta sociedade ela ouvira que os terapeutas são os amigos mais confiáveis. E ela sempre desejava ter um amigo, conquistou tudo na vida. Mas faltava algo, um amigo, um terapeuta seu dinheiro podia pagar.

Ficou durante três meses a pensar, ir ou não ir. Já tinha marcado e remarcado a consulta pelo menos umas nove vezes. Ela pensará como sua vida era uma verdadeira mentira. E comprar um amigo seria se enganar mais uma vez.

A chuva ainda caia forte em suas costas, entrou no consultório. E lá estava, meu amigo? Será? Ela não sabia o que era um amigo, ela só tivera o amor de sua mãe, um amor platônico na adolescência, e muitos amantes ao longo de sua vida, todos os outros eram apenas vermes. Criaturas sebosas, nojentas, interesseiras e falsas. Definitivamente, ela não sabia o que era ter um amigo.

O terapeuta chama-se João Alberto Vilas Boas. Aqui soou ao seus ouvidos como uma amizade de longas datas. Ele era realmente simpático, homem vistoso, cabelos já grisalhos denunciando a sua vasta experiência.

- Olá, como qual é seu nome?

Silêncio. Ela pensou. Meu nome?! Qual dos... seu pensamento foi alto, ela pensou durantes alguns segundos que lhe pareceu uma eternidade de uma vida de mentiras. Enfim retrucou:

- Como assim meu nome? Qual o nome que você quer?

O médico meio amedrontado, disse.

- O nome que te deram quando você nasceu.

Num suspiro em alturas, ela disse.

- Rosana.

- Lindo nome.... Rosana é nome Santo!

Silêncio. Ela pensou consigo, santo? Isso existe? Ela só tinha escutado falar de Deus, santos, religião pouquíssimas vezes, e sem mentia. Já foi budista, católica, evangélica, cristã, espírita... a depender do que te agradava no momento. Ela podia ter a religião que quisesse, era só dizer, todos acreditavam. Ela tinha o dom de mentir! Era seu talento nato.

O Terapeuta interrompeu seu silêncio e disse.

- Sim, Rosana, me diga! Qual o seu problema?
Silêncio. Ela já ficará irritada em só pensar, aquele silêncio remoia por dentro, ela não tinha resposta pra nada. Não sabia que era tão difícil ter um amigo. Aquelas perguntas difíceis confundiam o seu juízo. Ela pensava, e o silêncio entranhava mais e mais. Se questionava, se perguntava e mesmo respondia. Meu problema? Não sei? Talvez eu. É, acho que o problema sou eu.

E o Terapeuta assustado com o silêncio que durava horas e horas, interrompeu o seu momento mais uma vez.

- Fale sem pensar. Por que você veio aqui?

Ela subitamente, em meio a um impulso inevitável disse.

- Vim à procura de um amigo.

O terapeuta meu desconcertado tomou o silêncio de Rosana para ele.

Ela era uma cliente diferente das outras. Era já uma senhora, e ainda procurava por um amigo? Por Deus, em que mundo está mulher vive. E a indagou?

- Não tem amigos? Que tipo de pessoa é você?

Rosana, não suportou mais uma pergunta difícil e saiu rapidamente da sala, como se fosse um bicho selvagem. E ali nunca mais voltou.

Sentou- se num bar e pediu uma bebida. Há tempos ela não bebia. Esquecerá até o gosto que dia um belo e aveludado vinho. Ela desejou aquele cálice e bebeu. Engoliu todas as lembranças de seu passado, sentiu uma tontura de vida. Pensou no terapeuta, pensou em suas perguntas difíceis.

Vamos lá Ana, Poliana, Tatiana, Juliana e/ou Rosana, nem eu mais sei quem é você. Saiu de mim, mas nem eu mesma te conheço. Como posso contar quem é você, e qual é mesmo seu nome. Essa sua mentira te empurra num abismo sem fim.

Chovia vento forte aquela noite era a mais fria. Já tinha tomado meia garrafa do vinho, ela se embriagava e bebia um pouco de si em cada cálice de vinho.
Rosana desmaiou em palavras... o que teria acontecido? A mentira a matou? E em sua mão esquerda estava um papel amassado, com alguns rabiscos. Seria o seu último poema? Ela era mistério, era pergunta sem resposta, era uma mentira, era um eterno poema...

Qual o seu nome?

O vento soprou ao meu serUma pergunta intriganteQual o seu nome?!Se o nome é doado quando se nascePois bem, que nome terei?!Se eu já nasci tantas vezesOntem eu fui uma criançaHoje eu sou uma mulherAmanhã quem sabeTalvez eu seja criança novamenteOu tão velha a ponto de morrerÀs vezes sou AnaUm bebê que acabou de nascerFrágil e indefesaAdoro chorar pra chamar atençãoÀs vezes sou PolianaUma criança que tento esconderInfantil e inocenteAdoro brincar e rir de tudo sem compromissoÀs vezes sou TatianaUma garota que gosto de serImpulsiva e rebeldeAdoro ser difícil e complicada de entenderÀs vezes sou JulianaUma mulher que preciso serResponsável e independenteAdoro ser séria e madura ao ponto de me compreenderÀs vezes sou RosanaUma senhora que não quer envelhecerSábia e experienteAdoro sonhar em ser criança outra vezMas, qual o seu nome?!Depende como me chamarPosso ser Ana, Poliana, Tatiana, Juliana ou RosanaPosso ter o nome que você quiser ouvirSeja boa ou ruimApenas sou quem sousem definiçãosem limitaçãosem descriçãoTodas elas eu souDe que serve um nomeSe posso ter tantos outrosConfesso não saber quem souMas sei o que desejo ser hojeE o agora é o que me importaPois eu me permito ser quem eu desejar serMuito prazer, hoje sou o que você não ver

Devo revelar a verdadeira mentira. Sim, a minha personagem ainda está viva. Não morreu. Você não vê, não consegue enxergar? A morte é uma verdadeira mentira. Esse poema é a prova viva de que sua existência. Reencarnada e viva durante anos ainda vai está entre essas palavras. Sim, isso é ressuscitar, das cinzas a luz divina. A palavra escrita permanece viva.

Mas de fato, que ninguém saberá a verdadeira mentira. Esse era seu mistério. Seu segredo. E mistérios não se revelam, senão deixam de ser mistérios. Assim como, segredos não se contam, senão deixam de ser segredos. Tudo o que posso dizer é que hoje me sinto mais aliviada. Essa personagem estava em mim, e precisava sair. Ela gritava toda noite, pedindo socorro. Eu era apenas a sua embalagem. O plástico azul marinho. A artista aqui não sou eu, é ela que estava em mim.

Ufa! Aliviada estou, só não sei até quando irá durar esse meu alívio. Meu envolto é diferente do outro que possuir. É, eu cresci! E de fato, que todos nós temos um problema, e o meu é escrever. Agora, eu só desejo beber um cálice da mais pura verdadeira mentira! Tome um cálice, embreasse na impressão de um olhar... O vinho está uma delícia, já estou completamente embriagada, deu até vontade de me mudar! Irei agora limpar o chão, está cheio de respingos.

Um comentário:

Unknown disse...
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