quinta-feira, 10 de outubro de 2013

FUTEBOL DE RUA



Bola rolando
Na praia, na lama, no asfalto
Mas que seja no meio da rua
E nos grandes clássicos, o calçadão inteiro
Abri o placar, e é gooool

Qualquer coisa assim que role
Uma lata vazia, garrafa pet, bola de meia
Não tem tempo ruim pra essa galera
O lance aqui é jogar na raça
Suor pingando, pés rachando

Ruim vai para o gol
Com o que estiver à mão
Pedaço de pau, chinelos, camisas emboladas
Perneta joga na ponta
Do lado da perna que faltar

Mulher gostosa desfilando na rua
Final do primeiro tempo
Arrancou o tampão do dedão do pé
Substituição

Bola fora de jogo
Só na vidraça da janela dos outros
E, se entrar, é Gooool
A bola rola até escurecer
E a vizinha ameaça chamar a polícia
O juiz apita, final de jogo
A vitória é de todos, é nossa, é do povo

Todo mundo bate sua bolinha
Mas quem nunca jogou no meio da rua
Deixou de marcar um golaço
Isso sim, é time de tradição
Isso sim, é futebol de rua 


Texto: Laila Guedes 
Fotografia: André Fernandes





O BRILHO PASSA TÃO RÁPIDO QUE A GENTE NEM PERCEBE



Estou naqueles dias. Choro com um simples pássaro voando no céu. Perco a paciência, se é que ao final me restou alguma. Como compulsivamente e escuto aquela voz do além dizendo "boca nervosa". Após alguns minutos de silêncio, com a boca ainda cheia tento disfarçar fazendo movimentos lentos com a boca sem fazer barulho algum. Deixo escorrer uma lágrima, pronto, chorei por que comi demais. Não demora muito, retomo a consciência, enxugo as lágrimas e faço cara de completa indignação. Tem certos tipos de comentários que é bom e ruim ao mesmo tempo, mas não falo nada ou falo uma coisa querendo dizer outra. "É só hoje, estou de TPM".
Mas antes que me faltasse a paciência novamente, julguei-me, precoce e estupidamente, clichê. Porque toda mulher tem TPM, umas poucas, outras muitas, mas eu sou além da conta. Me dá até insônia. Já escutei música. Comi um prato de macarrão com frango. Dois pães. Um pacote de biscoito. Goiabada com queijo. Biscoito de maisena embebido no achocolatado bem gelado. Aquelas trufas de chocolate escondidas debaixo das blusas antigas na última gaveta. A sobra do bolo do aniversário de anteontem. A barriga estufa e quase não entro naquele pertinho básico, porque nenhuma outra roupa serve ou no mínimo não cabe de tão inchada. Me arrumo e saio às pressas. Na porta da minha casa o marido da minha melhor amiga buzina para que eu saia rapidamente. Entro no carro ainda colocando os brincos, cumprimento os dois que me recebem com um belo sorriso. Quase eu choro, mas não chorei.

Chegando no barzinho, eu, minha amiga e o marido. Logo depois chega mais dois casais de amigos deles. E eu de TPM, solteira e segurando vela. Diga-se de passagem 3 velas. Hoje é o ápice. Só me resta beber. Peço ao garçom uma caipirinha, depois outra e outra. Após 3 caipirinhas, sinto-me um pouco mais leve. Meu celular toca e rapidamente lembro que havia combinado com outro amigo de sair. Apago as velas e saio quase que fugida dali. Corro pro cangote do meu amigo, onde afolgo toda a minha carência. Já em outro bar, peço uma cerveja, depois outro e outra.

Resultados da noite: 3 velas, 3 caipirinhas e 3 cervejas. Parece até folheto de cartomante trago a pessoa amada de volta em 3 dias.

Já em casa, tão bêbada que nem lembro como cheguei, abro a geladeira pego um pedaço de lombo coloco dentro do pão e como. Passo o dedo no farelo do bolo que ainda resta na travessa. Tomo um copo de suco para ajudar a descer tudo. E choro, ou melhor esperneio, me sentindo uma gorda. Imediatamente enfurecida, subo as escadas aos tropeços chego ao quarto abro a varanda e olho pro céu que incrivelmente, apesar de ser noite está com uma tonalidade de azul que é a minha favorita. Olho pro lado e quase nem vejo de tão rápido, uma brilho luminoso rasgando o céu. Foi uma estrela cadente? Caramba, eu tinha direito a um pedido, mas não o fiz. Eu choro. Às vezes é assim, o que brilha passa tão rápido que a gente nem percebe. Agora só me resta acreditar no prazo de 3 dias da cartomante.


Texto: Laila Guedes
Imagem que ilustra a coluna no adorável Traços, riscos e rabiscos.

ALVORADA

Pássaros em alvoradas sempre voam muito, com o toque do canto das aves, anunciam o desejo de aumentar o bando, como mais um galho da árvore que brota verde e florido. E de lá nascem lindas flores como a mesma plumagem, dentre muitas outras que ainda virão à brotar. Enquanto outros voam juntos,algumas aves voam de forma apertada e por conta disto se perdem uma das outras. Foi num temporal, um vento forte levou uma das flores para bem longe, num bando meio afrouxado. 

Um lenhador da região encontrou a flor no chão e sem nem perguntar o que ela queria, resolveu trancá-la em uma gaiola por um longo tempo. Ele a queria somente por posse de ter algo tão belo para admirar. Foram em vão as inúmeras tentativas de fuga da flor, que implorava pelo seu lar, mas o lenhador sempre alegava que aos poucos com o tempo todas as outras aves do bando iriam morrer, e por isso não teria tanta importância em voar para tentar um possível reencontro.  O que talvez ele não saiba é que amores de verdade nunca morrem, eles apenas adormecem em sono profundo. E nada adianta aprisionar uma flor, se não sabe regar, cuidar.

Talvez, por este motivo a flor de plumagem alva e colorida nas pontas não murchou completamente. O mesmo vento que a levou trouxe ela de volta ao seu bando, com toda a certeza por um motivo ainda maior. De fato que o lenhador foi um daqueles homens que usam o Machado para derrubar uma árvore, em busca da flor que o encantou. Mas, existem árvores que permanecem apenas pássaros que pousam numa flor e por ali constrói seu ninho minúsculo, porém muito bonito. E, por incrível que pareça, esse pequeno e frágil abrigo resiste ao vento, às chuvas e ao crescimento dos filhotes. 

Texto: Laila Guedes
Imagem que ilustra a coluna no adorável Traços, riscos e rabiscos.