Estou naqueles dias. Choro com um simples pássaro voando no céu. Perco a
paciência, se é que ao final me restou alguma. Como compulsivamente e escuto
aquela voz do além dizendo "boca nervosa". Após alguns minutos de
silêncio, com a boca ainda cheia tento disfarçar fazendo movimentos lentos com
a boca sem fazer barulho algum. Deixo escorrer uma lágrima, pronto, chorei por
que comi demais. Não demora muito, retomo a consciência, enxugo as lágrimas e
faço cara de completa indignação. Tem certos tipos de comentários que é bom e
ruim ao mesmo tempo, mas não falo nada ou falo uma coisa querendo dizer outra.
"É só hoje, estou de TPM".
Mas antes que me faltasse a paciência novamente, julguei-me, precoce e
estupidamente, clichê. Porque toda mulher tem TPM, umas poucas, outras muitas,
mas eu sou além da conta. Me dá até insônia. Já escutei música. Comi um prato
de macarrão com frango. Dois pães. Um pacote de biscoito. Goiabada com queijo.
Biscoito de maisena embebido no achocolatado bem gelado. Aquelas trufas de
chocolate escondidas debaixo das blusas antigas na última gaveta. A sobra do
bolo do aniversário de anteontem. A barriga estufa e quase não entro naquele
pertinho básico, porque nenhuma outra roupa serve ou no mínimo não cabe de tão
inchada. Me arrumo e saio às pressas. Na porta da minha casa o marido da minha
melhor amiga buzina para que eu saia rapidamente. Entro no carro ainda
colocando os brincos, cumprimento os dois que me recebem com um belo sorriso.
Quase eu choro, mas não chorei.
Chegando no barzinho, eu, minha amiga e o marido. Logo depois chega mais
dois casais de amigos deles. E eu de TPM, solteira e segurando vela. Diga-se de
passagem 3 velas. Hoje é o ápice. Só me resta beber. Peço ao garçom uma caipirinha,
depois outra e outra. Após 3 caipirinhas, sinto-me um pouco mais leve. Meu
celular toca e rapidamente lembro que havia combinado com outro amigo de sair.
Apago as velas e saio quase que fugida dali. Corro pro cangote do meu amigo,
onde afolgo toda a minha carência. Já em outro bar, peço uma cerveja, depois
outro e outra.
Resultados da noite: 3 velas, 3 caipirinhas e 3 cervejas. Parece até
folheto de cartomante trago a pessoa amada de volta em 3 dias.
Já em casa, tão bêbada que nem lembro como cheguei, abro a geladeira
pego um pedaço de lombo coloco dentro do pão e como. Passo o dedo no farelo do
bolo que ainda resta na travessa. Tomo um copo de suco para ajudar a descer
tudo. E choro, ou melhor esperneio, me sentindo uma gorda. Imediatamente enfurecida,
subo as escadas aos tropeços chego ao quarto abro a varanda e olho pro céu que
incrivelmente, apesar de ser noite está com uma tonalidade de azul que é a
minha favorita. Olho pro lado e quase nem vejo de tão rápido, uma brilho
luminoso rasgando o céu. Foi uma estrela cadente? Caramba, eu tinha direito a
um pedido, mas não o fiz. Eu choro. Às vezes é assim, o que brilha passa tão
rápido que a gente nem percebe. Agora só me resta acreditar no prazo de 3 dias
da cartomante.
Texto: Laila Guedes
Imagem que ilustra a coluna no adorável Traços, riscos e rabiscos.
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